O mundo é mesmo do tamanho de uma tangerina!
Como pode o meu coração, de um dia para o outro, ficar dimensionado a uma ervilha e pesar toneladas?
sim... estou a falar contigo! responde-me! tu que vives dentro de mim e não me obedeces! mal agradecido!
Levo-te a passear, ofereço-te tantas coisas boas e é assim que me tratas? Eu própria fico do teu tamanho quanto me respondes assim, deixas de ser o meu núcleo, passas a ser o meu SER!
Não, não respondas às urgentes perguntas que te fiz! deixa-me confinada a um grão de pó... achas que mereço?
Às vezes és cruel ao ponto de me matares a sede com água salgada... bem... talvez seja melhor não te falar assim em liberdade! ... não vás tu revoltar-te e pregar-me alguma partida das tuas!
"Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas.
Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio.
Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação.
Não posso adiar o coração."
António Ramos Rosa
Vôo 1692...
"Se devagar se vai ao longe, devagar te quero perto mesmo que o que arde nunca se cure vou beijar-te a sol aberto" Sergio Godinho in Definição do Amor
... é voltar!
Escrevo-te...
... para te dizer que me sinto feliz só de pensar que olhamos o mesmo céu!
Fazem-me falta as palavras que te digo... Devolve-me o tanto que tenho para te dizer!
Faz-me falta o cansaço, a mochila a pesar nas costas... Devolve-me as pernas que me permitem voar!
Fazem-me falta os dias que passam como um sopro... Devolve-me essa brisa, esse vento!
Fazem-me falta as gargalhadas que fazem eco numa praça qualquer... Devolve-me o espelho que sorri, uma lágrima de rir!
Faz-me falta a tua tonalidade... Devolve-me o pincel que pinta as cores que visto!
Faz-me falta a dor de barriga do inesperado, o beijo roubado... Devolve-me os pelos que eriçam!
Faz-me falta a protecção do teu braço a cobrir-me os ombros... Devolve-me o sol clandestino que me queima a pele!
Tenho saudades... de te olhar longamente...
io aspetto...Baci!
René Magritte
Acordo..
Os olhos estavam baços... cerro-os, esfrego-os com veemência como quem quer penetrar além do atingível!
O teu rosto? pergunto-me e arrisco-me a requestá-lo nos breves instantes que se seguem...
Destapo todos os episódios, desobestruo todas as portas, escavo um beijo distraído, invado museus, corro por ruas e artérias, ingresso na cólera de um filme mudo.. nada!
Sinto um náufrago no peito, por instantes fico a boiar no infinito a consumir pirulitos por conta própria!
Este acordar carnívoro nos mornos lençois faz-me abandonar o chão, abala a realidade de todas as coisas...
Que agonia é esta? Que me segue os passos, que me espreita os gestos, que me assombra o corpo, que me acorda de noite e me grita de dia?
Rendo-me?
Cinco e meia da tarde, meia para as sete da hora antiga. Sento-me ao pé de mim para escrever, a caneta leva-me até ao último e unico andar do prédio, mais precisamente ao quarto vazio que mora dentro de mim!
Nesse quarto recheado de nada, noite após noite ouço um ruído que ensurdece o silêncio, um compasso proveniente de um relógio de parede que faz a soma dos dias como se de uma calculadora barata se tratasse.
Ao longo das quatro paredes brancas que me envolvem, estende-se a sombra imensurável de uma cadeira de baloiço que ainda se move...
No canto, amachucada e no chão, encontra-se uma folha descolorida, com palavras rasgadas e garatujadas de um dia mais colorido que aos poucos foi perdendo a tonalidade... já nada se lê! sobraram apenas as reticências e os "ses".
O vento que despreza a rua, entra sem pedir licença, entranha-se nas cortinas e desvenda o quotidiano, desenhos sobre a normalidade das pessoas que oferecem os "bons dias" umas ás outras... Chego-me à janela para ver!
Tropeço agora no tapete que outrora esteve estendido, bordado a fio de suspiro e estampado de imagens de momentos que me rasgam as defesas
Bocejo, fico enfadada, aconchego-me e preparo-me para passar mais uma noite em branco com receio de que os sonhos venham visitar-me e eu, por desleixo, esteja a dormir...
http://www.youtube.com/watch?v=UDorNilxPUY
Na liberdade da solidão, acordas do lado deserto da cama, é nesse lugar onde mais te encontras
Na multidão de desconhecidos pareces sentir segurança
Na estrada da vida sem mantimentos afectivos procuras a saída, fazes do amor um singular
De costas curvas carregas o luto dos dias que por ti passaram
Prenuncias palavras que te minguam o coração
Julgas-te confinado á "solitária" de nome vida, acordas e olhas o espelho com ar ameaçador e agressivo... fabricas um sorriso
Já nada te sacia... só a ti te procuras
As carências sao a bagagem que te move
Nenhuma reacção! ... e o silencio já soa a castigo
Gastas oxigénio aos poucos só para sentires o sufoco de que mascaras a ansiedade
A todo o custo, sem preço nem medida.. onde quer que esse caminho te leve
Pensas ter perdido esse tudo que não aceitas seres TU e tentas provar o amargo, não na boca mas no peito, que te trará a tão desejada vitória na luta constante contra os teus limites...
Eu perdi... e tu?
"Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco"
Mário Cesariny
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