Há uma outra viagem, um destino para o qual nenhuma companhia aérea se lembrou de promover voos, ainda...
Custa-me acreditar que muita gente prefira passar a vida inteira a fazer fins de semana no algarve ou a voar uma vez por ano para as caraíbas e se recuse a aceitar esta viagem adentro.
Sim, bem sei que fica longe de qualquer lugar habitado e não, não há estações de serviço por perto, nem tão pouco areias brancas, rum e jamais a opção de "tudo incluído"... talvez por isso.
À semelhança de terminais de aeroporto, cais marítimos e estações de comboio, também este destino é palco ora de agitação ora de pacificação... e ás vezes dói.
Aqui, ninguém, além de nós sabe o nosso nome, não se aceitam grupos nem tão pouco casais (por muito íntimos que sejam)... estamos à mercê, por nossa conta e risco...
Há até quem cá venha porque, tal e qual se pode perder uma mala, se pode perder o nome e tudo o que ele encerra em si, tudo excepto o corpo! Às vezes é apenas ele, esse pedaço de carne coberto de roupas que aqui chega, sem malas, sem nome, sem missão mas com uma data de regresso "o mais rápido possível". Aqui queremos sempre ir num pé e vir no outro porque estar a sós neste deserto de encontros por resolver é sempre uma data adiada e apagada pelo som do rádio do carro, pelos tempos livres que deixam de o ser quando os atafulhamos igual barriga cheia de papo para o ar, ou por compromissos vazios regados a chá de camomila...
E aos poucos, muito devagarinho, vamo-nos afastando não só desta viagem, mas de nós próprios, do nosso avesso e de tudo o que somos e fomos... um livro familiar num idioma desconhecido!
haverá alguma explicação cientifica, alguma lei do universo que possa explicar porque raio levamos apenas algumas horas a atravessar milhas de algodão branco a chegar a sítios do outro lado do mundo e aqui, tão perto, atrás da ponta do nariz, sem precisarmos sequer de virar a esquina, podemos levar uma vida inteira de caminho?!...
Não há guias, gps ou coordenadas que nos valham... Mais que turistas perdidos, somos reféns do desconhecido, resta-nos o instinto e até que cheguemos vamos desbravando, caminhando, abrindo, procurando, desabotoando...
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