"A coisa mais dificil e mais bonita de partilhar entre duas pessoas é o silêncio"
Já não me falta entender, admirar e dizer o silêncio. Consigo senti-lo, saber-lhe a cor, seguir-lhe os passos.
A sua irreversíbilidade devota, saboreio-a numa degustação demorada, longa, longamente, igual bebida etílica que se quer aprisionar numa caixa calada onde voltamos de lés a lés para encontrar outros dias e esboçar aquele sorriso doce de antepassados... como se aquele momento voltasse, assim, ao abrir de um papel de rebuçado...
"(...) pode ser que a vida tenha razões que a razão não entende."
ou pode até ser que...
"Nada tem uma solução definitiva e não há nada que não tenha algum tipo de solução provisória."
mas por hoje, ao voltar de soslaio a essa mesma caixa, acredito no poder afirmativo da ausência e que...
"(...) se tudo à nossa volta deixa de existir e ter sentido, só resta o nada. E o nada é o nada: conforme se olha, é a ausência de tudo, ou, pelo contrário, o absoluto."
Ás vezes, as viagens, os lugares, as paragens nascem dentro de mim, assim, de um dia para o outro. Crescem, voltam e vão, afastam-se. Chego a perder-me no caminho, naquele que é o percurso mais habitual sem eu mesma dar por isso...
O acto de fugir chega a perder-se dentro de mim ao ponto de me fazer encontrar.
A imaginação vai, certos dias, de uma ponta á outra, até aos dois polos mais longinquos, desertos e por vezes frios, complexos, oriundos de todos os continentes, flora e fauna.
Mas também há dias e dias a fio, e esses são tantos, em que mesmo sem sair do lugar esse partir de dentro é constante, e então, tudo se constrói num batismo surpreendente. Primeiro uma conversa, depois um colar e recortar de ideias, leituras e afins e depois, só depois, tudo se transforma num esboço a carvão à mão da ponta de um lápis... que estes dias me levou até aqui...
Há que dar uma mãozinha ao destino de vez em quando,
Há dias em que temos de usar a imaginação e plantar algo por nós... Uma esplanada em São Pedro pode ser um palco se nos tornarmos atrizes, e nem precisamos de plumas nem lantejolas... apenas coragem, de não deixar em branco o que é para ser escrito! Pôr fim aos fins irreversíveis... acreditar na impossíbilidade real do encontro, no poder afirmativo da ausência e no seu sabor a possibilidade!
O ontem não ficou pela metade, as palavras não ficaram suspensas no nada e o dito não ficou por não dito...
Afinal... tenho um rosto...
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