Barulho infernal... ao fundo um letreiro que avisa "last call".. pessoas... é quase possível adivinhar-lhes o destino pela expressão que transparece em seus rostos, pelas roupas que ostentam em seus corpos.
Ao fundo uma rapariga, loura, parece tecer há horas, confecciona atarefada um cachecol que ultrapassa já os limites do necessário utilizando ingredientes de quem espera um dia voltar...
Ouvem-se soar destinos distintos e distantes.. um cá e lá, um vai e vem incessante mostra que o tempo não pára, que cada uma das pessoas que por ali passam, passam são substituíveis! mas que podem porém camuflar-se nas horas que separam os fusos horários... quantas gostariam de fazer parar o tempo?! e outras de o fazer correr?!
Num canto, um homem, cozinha palavras que serve quentes a uma senhora que as acolhe com um sorriso fazendo resvalar as suas mãos para o seu colo, são palavras belas que pelo sorriso esboçado, anunciam o desejo de querer contínuar a ouvir.. Parecem regressar, ou ainda sonham?
Entre passageiros consegue ver-se um senhor, alto, pele pálida e rosto cansado, esquisito, por vezes ri quando lê o que acaba de escrever, outras vezes amachuca folhas sem as ler, a seu lado uma criança, sentada bate os pés sem que cheguem ao chão, impaciente ... a única que me observa!
Agasalho-me.. afago os lábios com a lã macia do cachecol, como quem quer suster a respiração.. não quero perder um só momento, concentro-me em pormenores que ninguém vê..
Agasalho-me e vou ao teu encontro...
Prevejo dar-te um abraço e sussurrar-te Guten Morgen!
Quero conhecer os cantos à casa, roubar um bocadinho do dia a dia de quem por lá habita, vasculhar ruas, medir o perfil de quem passa, seguir os trilhos de casais felizes e desavindos, das heranças partilhadas, dos nascidos e "morridos"... e num atravessar de rua, como que uma corrente de ar, sentir a presença de Mozart, olhar no infinito pinceladas de klimt... beijá-lo!.. e recostar-me no divã de Freud...
Quero ir e voltar com um pedaço de ti!
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